terça-feira, 11 de março de 2008

A cidade Vazia - os efeitos dos shoppings


Nos anos recentes temos assistido a um crescente fenómeno de consumismo em toda a Europa, associado normalmente aos Centros Comerciais. Portugal tem sido também fruto deste fenómeno. Este fenómeno tomou conta dos mecanismos de urbanização das cidades, tanto sociais como politicas e tornou-se um mecanismo essencial para definir as nossas zonas metropolitanas.

A cidade passa a ser constituída por várias centralidades, passando a perder o domínio das ditas baixas da cidade, normalmente locais onde se desenrolava toda a vida económica e social da mesma em relação às coroas e periferias urbanas destas, onde se instalam os grandes centros comerciais, onde tudo é oferecido ao consumidor.

É obvio que este fenómeno, apesar de recente já criou um público, e já se enraizou nos hábitos de vida dos Portugueses. Minimizar este fenómeno ou arranjar uma solução para os centros das cidades, é urgente. Os centros cada vez mais decadentes são tornados novos vazios urbanos. Os centros comerciais têm de vir a fazer parte de uma rede de relações que passarão a governar a vida da cidade actual.

Esta mutação territorial está intimamente ligada as modificações socioeconómicas que o pais sofreu após o 25 de Abril de 1974. Com a queda do regime fascista em Portugal, assistimos a uma verdadeira revolução territorial das zonas costeiras, especialmente das zonas próximas de Lisboa e do Porto. Com a incorporação na comunidade Europeia nos anos 80, Portugal assistiu a um desenvolvimento da sua economia galopante, e onde o poder de compra dos próprios portugueses foi aumentado de uma maneira fora do normal. Em poucos anos o pais passou de uma economia essencialmente agrícola e fechada a uma economia liberal e com uma explosão do consumo enorme. A entrada em Portugal das marcas internacionais, dos franchisings, provocou uma súbita mudança nos hábitos dos portugueses.

Nos anos setenta assistimos à abertura dos primeiros centros comerciais,
mas só nos anos 80 e posteriormente 90 é que assistimos a uma vaga de comércio alternativo ao comércio tradicional dos centros das cidades.
É nos anos 90 que surgem nas coroas das nossas cidades, mega estruturas comerciais, como o Colombo em Lisboa e o Norteshopping no Porto.

A construção crescente e gradual deste modelo de centro comercial, em todas as cidades Portuguesas, têm feito mudar profundamente a mobilidade e as atitudes e próprio modo de viver dos portugueses.

Esta maneira de viver, tem substituído as próprias exigências do consumidor face ao comércio e face à cidade. O espaço público tem gradualmente vindo a ser substituído por as ruas praças dos centros comerciais, os cafés locais pelo franchising do caffé de Roma, as ruas mal iluminadas pelos corredores assépticos e limpos dos shoppings.

Na Europa assim como em Portugal o comércio era normalmente concentrado nas áreas das baixas das cidades, e o espaço público e de sociabilidade era feito nas ruas, no encontro das pessoas, quando iam às compras.

Contudo não podemos ignorar esta nova situação, a emergência de novos centros, muitas das vezes associados aos ditos shoppings, têm de se saber fazer no futuro com a reestruturação dos centros antigos. O centro da cidade deve ter a máxima acessibilidade, direccionalidade e ter um conjunto de símbolos identitários que o referencie do resto da cidade.

A explosão da cidade fez com que se perdesse o centro de muitas cidades, a consequente falta de acessibilidade deste e a transferência de fortes instituições como as universidades ou os bancos para zonas de mais fáceis acessos, fez estes locais perderem o seu sentido e a sua significação.

Os centros históricos devem passar a ser tratados como locais de excepção, pelo seu conteúdo histórico e simbólico dentro da cidade, nunca deixando que se tornem museus, é preciso viver neles e estes têm de ser recolocados no sistema de redes da metrópole.

Importa aqui reflectir sobre as possíveis opções a tomar no futuro, para podermos interligar a centro histórico da cidade portuguesa nas redes policêntricas, que a cidade actual é alvo. Não ignorando o efeito do shopping sobre a sociedade, interessa que a cidade crie actualmente uma satisfatória hierarquia entre centros e depois que consiga fazer uma possível ligação entre todos.
A questão da sustentabilidade, é outro factor a ter em conta, não ignorando que a revitalização, o reciclar dos nossos velhos centros históricos vai ser um dos passos fundamentais para podermos voltar a ter uma cidade mais concentrada em limites físicos.
As periferias actuais, e o enorme crescimento destas, assim como a cultura do carro, vão ter de ser suspendidas ou repensadas, já que será impraticável futuramente, devido à crise dos combustíveis fosseis, fazermos uma vida onde as deslocações sejam feitas com tão grandes distâncias.
O futuro das cidades passa pelo colmatar dos vazios existentes, pelo fim da cidade vazia.

10 comentários:

João Ribeirinho Soares disse...

"Em poucos anos o pais passou de uma economia essencialmente agrícola e fechada a uma economia liberal e com uma explosão do consumo enorme"???
???
Portugal tem uma economia mista que ninguém sabe muito bem o que isso é...

André Barbosa disse...

"Com a queda do regime fascista em Portugal, assistimos a uma verdadeira revolução territorial das zonas costeiras..."

Que regime fascista? O 25 de Abril acabou com um regime autoritario/repressivo e nunca com um regime fascista!

BSC disse...

João, não sejas agora mais constitucionalista que a Constituição que nem ela se leva a sério quando fala na nossa "bela" economia mista!!!!

Qto aos grandes centros comerciais das periferias, por mim iam todos abaixo que, na grande maioria dos casos, são perfeitamente detestáveis, mal frequentados e começam a ser focos de criminalidade e de violência (cf. Colombo e Oeiras Park). Qto a humanizar e revitalizar os centros das cidades é tudo muito bonito mas se não se investe nem promove a reabilitação (a preços acessíveis) como vamos conseguir trazer gente de volta à cidade?

Tiago Freitas disse...

concordo beatriz, os incentivos tenhem de partir da parte do governo...e em lisboa o caso não é tão problemático como no Porto, em Lisboa o centro da cidade é mais habitado que no Porto.

Rodrigo Lobo d'Ávila disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rodrigo Lobo d'Ávila disse...

Caro Tiago: Vais-me desculpar mas discordo completamente contigo. Existem outras cidades na Europa, todas elas vivas e todas elas com inúmeros shoppings. O vazio das cidades deve-se, na minha opinião, a essa soberbo monumento ao socialismo que é a lei das rendas. Esta visa atacar esses burgueses opressores que são os senhorios, pondo todos os entraves possíveis e imaginários a actualização dos valores das mesmas rendas. O resultado é belíssimo: os senhorios recebem pouquíssimo, levando a que não consigam manter as casas, levando a que a médio prazo, elas simplesmente caiam.
Depois arranjam-se sempre soluções maravilhosas, para trazer a “vida” de volta á cidade, como no caso do Bairro Alto em Lisboa: enche-se uma zona histórica da cidade de bares, para gerar movimento á noite. O resultado é óptimo: uma “horda” de 150000 bêbados atravessa todas as noites o bairro alto; o pormenor dessa “horda” contribuir em grande medida para a degradação, ainda mais rápida dum bairro, que podia ser a zona mais cara de Portugal, é que ninguém repara.
Claro que é sempre ideologicamente mais “fashion”, gritar contra o malvado do capitalismo, representados pelos shoppings, do que apresentar uma solução relativamente simples e não ideológica.
Eu cá por mim acabava com a lei das rendas e deixava o mercado (esse bezerro de ouro do capitalismo) decidir o valor das rendas. Não gosto muito de grandes “engenharias sociais: geralmente dão grandes “cagadas”.

Tiago Freitas disse...

concordo contigo rodrigo, mas os shoppings é um efeito perigoso do fim do comércio de rua, porque não adoptar os grandes armazéns nos centros das cidades, se reparares os shoppings, e o conceito de shopping não é o de grande armazém, esse sim é uma caixa que vive para si própria e acaba com tudo o que está em volta, pelas vantagens da climatização artificial, entre outras, em relação ao bairro alto concordo contigo, o bairro vai-se esvaziar do seu verdadeiro sentido de bairro lisboeta, com mercearias, tascos e afins para passar a ter um conjunto de bares todos iguais, e a população genunina acaba por sair de lá levando o bairro ao abandono...

BSC disse...

Tiago, tu és sp muito intervencionista e estatista! Pq será que a recuperação de bairros históricos não pode ser feita por fundos imobiliários privados?? Do conhecimento que tenho, o que de melhor se tem feito de recuperação urbana tem sido por grupos privados e não pela intervenção do Governo, que geralmente intervém onde e como não deve!

Qto ao Estado, infelizmente a verdade é que o conceito de urbanismo e de ordenamento urbano ainda não estão na moda e não há políticas públicas de planeamento das cidades nem de ordenamento do território (isso sim, verdadeiras funções do Estado). Se fossem usados integral e adequadamente os instrumentos de gestão territorial já previstos na lei tlv toda a estrutura urbana pudesse ser diferente!

Tiago Freitas disse...

por mim acho óptimo que sejam feitas intervenções pelos privados, e concordo que o estado realmente não têm uma acertada politica de ordenamento do território nem das cidades...Só a uns anos é que passamos a dispor de PDMs para todas as nossas cidades...

BSC disse...

E nem sei se já todas terão PDM... e se estes estiverem feitos com tanto cuidado como foi delimitada a REN, então nem vale a pena pensar! Isto para já nem falar no Plano Nacional de Política de Ordenamento do Terriotório, previsto desde 98, e até hoje um mito urbano (ou nem por isso) que nunca ninguém viu!
Enfim, por mais que a CRP diga que todos temos dto ao Urbanismo e ao Ordenamento do Território, por mais que a legislação nessa matéria seja completa e vanguardista, a verdade é que Portugal não sabe organizar o seu território, não sabe criar políticas integradas de gestão territorial e a maioria dos autarcas não conhece o conceito de planificação urbana! Uma selva, é o que temos!